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Gestores argumentam contra e a favor da polêmica PEC 241 (PEC 55)

23 de Novembro de 2016



Após aprovação na Câmara dos Deputados, no dia 26 de outubro, a PEC 241 tramita no Senado como PEC 55. Em entrevista, GGOVs opinam sobre os impactos da proposta que tem causado divergência no país

Apresentada pelo governo Michel Temer, a Proposta de Emenda Constitucional 241, agora PEC 55, tem o objetivo de frear o crescimento dos gastos públicos e tentar equilibrar as contas públicas, congelando os gastos que serão reajustados apenas pela inflação do ano anterior, caso a medida entre em vigor.  A proposta tem causado polêmica e protestos por todo o país. Especialistas se dividem sobre o tema. Até mesmo a Procuradoria Geral da República chegou a se posicionar sobre a PEC, no dia 7 de outubro, divulgando uma nota que declarava a Proposta como inconstitucional por ofender “a independência e a autonomia dos Poderes Legislativo e Judiciário e a autonomia do Ministério Público e demais instituições constitucionais do Sistema de Justiça”.

Apesar da polêmica, a PEC foi aprovada em 2º turno na Câmara e agora está no Senado aguardando a primeira votação, que está marcada para o dia 29 de novembro. Os favoráveis à medida alegam que ela é necessária para que haja uma recuperação na confiança do mercado, geração de emprego e renda e contenção dos gastos públicos. Os que são contra afirmam que é um retrocesso, além de ser uma medida que vai causar impactos em duas áreas prioritárias para o bem estar social: a saúde e a educação. Aqui, dois GGPOGs se posicionam a respeito da PEC do teto, como ficou conhecida a proposta. São eles Rodrigo Valença, Superintendente de Tecnologia, Orçamento e Finanças do Distrito de Fernando de Noronha e Vitor Costa, Diretor de Sistemas Corporativos Financeiros na SEFAZ.

1- Qual é a sua opinião em relação à PEC 241, você se posiciona a favor ou contra e por quê?

Rodrigo Valença: O Brasil enfrenta uma grave crise econômica, com rápido aumento do desemprego e da inflação e consequente perda do poder de compra. Sem dúvida, um cenário que exige medidas austeras por parte do Governo Federal para que o País possa estancar a neutralização dos ganhos sociais percebidos nos últimos anos. Porém, apesar de possuir pontos positivos, o congelamento linear sugerido pela PEC 241 representa uma forma simplista de tentar resolver o problema. O Brasil possui extremas carências sociais que ainda demandam priorização dos investimentos. O congelamento dos recursos destinados a determinadas áreas (como saúde e educação, que, por sinal, possuem regras constitucionalmente estabelecidas para direcionamento de recursos baseadas na receita) ensejaria um retrocesso nas políticas públicas não só de curto prazo, mas, principalmente, nos projetos estruturadores de longo prazo, haja vista que a primeira revisão das medidas seria possível apenas após 10 anos. Além disso, a PEC põe em risco o crescimento do salário mínimo acima da inflação, caso o Estado não cumpra os limites estabelecidos pela proposta. Portanto, sou contra a PEC 241.

Vitor Costa: Considero a intenção do governo em atuar na gestão da despesa pública muito válida, ainda que não seja 100% a favor do projeto da forma que está posta, a exemplo do prazo muito extenso de 20 anos, pois se a PEC der certo e a arrecadação subir muito, o estado tenderá a fazer caixa, o que não deve ser um objetivo do governo, apesar de improvável. Temos convivido num cenário muito delicado nas contas públicas que estão refletindo na economia do país, seja internamente ou externamente.  O estado mesmo numa situação crítica não consegue parar de crescer acima da sua receita. Dados do Ministério da Fazenda apontam que entre 2008 e 2015 os gastos com despesa primária cresceram acima da receita (50% contra 14%, respectivamente). Não é à toa que a dívida do Governo Federal cresceu proporcionalmente ao PIB. A dívida pública da União participava anualmente em média em 55% do PIB nesse mesmo período. Atualmente, em dados já de 2016, encontra-se em quase 70%. A média dos países emergentes é de 44%, dados de 2015 do FMI. A União carrega consigo mais de R$ 170 bilhões de déficit. Para se ter uma ideia do que isto representa, esta monta daria para financiar 7 anos do programa bolsa família. Então, fica muito claro que a situação é grave e não se amortiza um déficit tão volumoso sem reflexos incômodos. Atenta-se ainda que a Previdência, despesa mais descontrolada do governo, nem é tratada nesta PEC. A PEC tenta nortear a política fiscal como saída da crise impondo um teto global para o governo, deixando livre para o governante fazer suas opções, definir suas prioridades, sem necessariamente crescer o gasto público. Mesmo que um determinado programa ou órgão ultrapasse o seu próprio teto, o governo poderá fazer medidas compensatórias em outras áreas. O que a PEC sinaliza, em suma, é frear o crescimento do estado como um todo, que estava inchando e avançando muito acima da receita, rumo à insolvência. Não se estará obrigatoriamente diminuindo o estado, com as correções de inflação como teto máximo de “crescimento”, na prática o estado poderá ser mantido do tamanho que já está. Poderá até crescer em determinadas áreas.

2 – Que benefícios o cumprimento da PEC do teto traria para o país?

Rodrigo Valença: É cediço que o aumento desregrado dos gastos públicos é um dos principais fatores que resultaram no atual cenário de contas devastadas. Em termos práticos, o congelamento das despesas ajudaria a recuperação do equilíbrio com a receita, que é um ponto basilar para frear o aumento caótico da dívida pública brasileira e que, caso não sejam tomadas medidas urgentes, levará o País à insolvência. Além disso, seria uma sinalização positiva para o mercado, auxiliando na recuperação da confiança perdida nos últimos anos e que resultou, entre outros fatores, no rebaixamento do Brasil pelas agências internacionais.

Vitor Costa: Os benefícios em resumo são: corrigir o déficit fiscal atual; demonstrar ao mercado que o país está preocupado com a saúde de suas finanças e está buscando seu equilíbrio; evitar crescimento da carga tributária; evitar crescimento da dívida pública sobre o PIB; aumentar a eficiência, fazendo mais com menos recursos; criar aculturamento mais forte da gestão da despesa pública pelo Executivo enfatizando a qualidade do gasto, tendo fiscalização pelo Legislativo; forçar ao governante a fazer escolhas adequadas de acordo com as prioridades, tornando mais claro à população suas reais intenções e equilibrar melhor a balança entre Quantidade (R$) versus Qualidade, afinal, já não temos serviços de qualidade, mesmo tendo elevada arrecadação.

3 – Qual será o impacto da PEC 241 na saúde e na educação?

Rodrigo Valença: A saúde e a educação são direitos sociais constitucionalmente estabelecidos e precisam ser priorizadas. O Poder Público ainda não atingiu patamares minimamente satisfatórios de atendimento à população nessas áreas. Obviamente, políticas públicas de sucesso não são compostas apenas de recursos financeiros, mas também de boa gestão focada na qualidade do gasto – outro grande problema do Estado brasileiro. Contudo, diante da precariedade em que esses setores ainda se encontram e da sua essencialidade para mudanças sociais estruturais de longo prazo, o congelamento dos percentuais mínimos de investimentos nessas áreas poderá ser fatal para programas que vêm buscando avançar na qualidade da prestação desses serviços, como, por exemplo, o Plano Nacional de Educação.

Vitor Costa: A União, atualmente, para a educação, tem por obrigação constitucional direcionar no mínimo 18% da sua receita líquida de impostos. Já para a saúde são no mínimo 13,2%. Com a PEC, a regra passará a ter como limite o ajuste inflacionário do ano anterior, assim como as demais despesas enquadradas. Porém, é importante ressaltar que o teto não será congelado para cada despesa. O teto poderá ser compensado, ou seja, caso o governante queira priorizar educação e/ou saúde, terá a liberdade de direcionar orçamento de qualquer valor, mesmo acima do ajuste da inflação, bastando apenas que se compense em outras áreas. Então, cabe esclarecer que o teto é global. Outra informação importante quanto ao financiamento da educação é que a PEC não afetará os repasses para o FUNDEB, Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação. Esse fundo tem por objetivo complementar o financiamento do ensino fundamental, da educação infantil, do ensino médio e da educação de jovens e adultos; que são providos pelos estados e municípios. Além da garantia de não alteração no FUNDEB, constata-se que grande parte do financiamento da educação pública fica a cargo dos estados e municípios, entes estes que não serão afetados pela PEC 241.
No caso da Saúde, o nível de destinação de recurso fica abaixo da média. Os gastos públicos com saúde representam aproximadamente de 3,6% do PIB (dados de 2013). Se somado com os gastos das famílias e dos convênios privados em saúde, chega-se a quase 9% do PIB. O Brasil é o único país entre as dez maiores economias do mundo em que os gastos privados, feitos pelos planos de saúde e famílias, superam os gastos públicos (Dados da OMS indicam que a proporção do financiamento fica com 47% a cargo do setor público e 52% a cargo dos pacientes). O que indica que de fato que há subfinanciamento no sistema público brasileiro. Contudo, quando comparado ao BRICS, o Brasil fica acima de todos eles. Já no cenário mundial, porém, os dados da OMS evidenciam que em média governos destinam 14% de seus orçamentos para a saúde. Nos países considerados ricos e desenvolvidos, a taxa é de 16,8%. Então, diante destes dados, há de se concluir que a situação atual dos índices constitucionais impostos à União para destinação de recursos à saúde pública não estão garantindo nem a quantidade de dinheiro necessária nem tampouco a qualidade do sistema. Tudo desemboca no foco nas escolhas adequadas diante das necessidades do país, e a PEC não afetará esta liberdade.

4 – A PEC do teto de gastos vai atingir igualmente ricos e pobres?

Rodrigo Valença: Não. Por uma questão simples: quem mais depende de investimentos em serviços públicos básicos é o pobre. Sua (pouca) esperança também será congelada.

Vitor Costa: Cabe deixar claro que o objetivo da PEC não é beneficiar determinada classe social, a verdade é que seu objetivo é ajustar a situação econômica do país pelo viés do controle do gasto público (política fiscal) de modo que possa reduzir o déficit e o endividamento públicos usando do mecanismo de tetos/limites de crescimento. O resultado dos efeitos da PEC sobre as classes sociais estará correlacionado às decisões governamentais, às escolhas. Os pobres, por exemplo, poderão não sofrer efeitos negativos, caso as escolhas sejam direcionadas às políticas que tenham reflexo nesta classe social. Além disso, a aposta da PEC é de que com o equilíbrio das contas, a economia poderá se estabilizar, voltar ao caminho do crescimento, viabilizando a diminuição do desemprego, menores taxas de juros, volta ao controle da inflação e incentivo à retomada de investimentos privados. Estes fatores acabam por auxiliar todas as classes sociais, inclusive os pobres.

5 – De que forma a PEC vai impactar no salário mínimo?

Rodrigo Valença: Caso o Estado não cumpra os limites propostos, o salário mínimo só poderá ser reajustado de acordo com a inflação. Ou seja, também será congelado. O aumento real do salário mínimo foi o responsável por uma mudança social e comportamental da população brasileira, dando condições ao assalariado de baixa renda de usufruir de serviços e produtos inimagináveis em outras épocas. É um lado perverso da PEC, mais uma vez trazendo prejuízos para as classes sociais mais baixas e apontando para uma tendência de desconstrução de conquistas sociais.

Vitor Costa: Sem dúvidas impactará, já que os crescimentos reais não terão mais vinculação a um índice. Atualmente, o salário mínimo é reajustado pela inflação do ano anterior (até aí tudo igual) somado da variação percentual positiva do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos anteriores. Com a PEC, as variações do salário mínimo obedecerão à mesma regra das demais despesas primárias. Podendo ganhar aumento real sim, a depender das escolhas do governante, e somente, no máximo o reajuste da inflação do ano anterior, se o governo exceder o seu teto global. A perspectiva é que com uma economia equilibrada, se gere um ambiente macroeconômico favorável que seja possível aumentar a empregabilidade e restabelecer o aumento do salário real. Nada adianta os salários aumentarem sem crescimento do país, convivendo com juros altos e baixa produtividade, o efeito é contrário, mais inflação, mais desemprego, menos crescimento, mais crise.

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